Cotidiano

Em 13 de setembro de 2021 – Redação – Por Sylvain Levy – Médico Sanitarista e Psicanalista

Todo dia ela faz sempre igual…
Todo dia eu só penso em poder parar
Meio-dia eu só penso em dizer não
Depois penso na vida pra levar
E me calo com a boca de feijão
Chico Buarque de Holanda – Cotidiano )1971)

Para começar é bom lembrar o dito popular: sapo não pula por boniteza nem por esperteza, pula por precisão. Bolsonaro não confronta por outra razão que não a própria necessidade de brigar.

Foto Internet

Psiquicamente é uma maneira de estar no mundo; estrategicamente é uma forma de desviar a atenção de problemas que o afligem e sobre os quais não tem a menor ideia de como enfrentar; taticamente é esperança de escapar de uma ordem de prisão; ideologicamente é a crença de que agindo assim consegue manter a coesão daqueles que o apoiam; e politicamente subtrai o foco da incapacidade de seu governo em apresentar soluções para os graves problemas brasileiros.

Jair Messias Bolsonaro faz isso(s) desde os primeiros momentos de sua investidura como presidente. É o seu cotidiano, algo tão importante que acontece todos os dias. Por essas razões não consegue, por exemplo, cumprir o prometido a Artur Lira (“não falo mais sobre voto impresso”) ou a Luiz Fux (“vamos harmonizar”). Voltando a outra história de sapo, “é a minha natureza”, disse o escorpião ao picar o batráquio no meio do lago, ocasionando a morte de ambos.

Talvez a presença dos sapos, nesse artigo, denote a esperança de outra história, a de que o sapo se transforme num príncipe, mas como é sabido e mais uma vez constatado, isso só acontece em fábulas infantis. Não há possibilidades dessa transformação da realidade. Quem planta couve não vai colher banana.

Mas a mobilização precisa ser constante, não importa as consequências. Paralisar estradas, com bloqueios de caminhoneiros, pode desgastar um governo já fragilizado, mas mantém a chama da insurreição. Entregar um pedido infrutífero de impeachment de ministros do STF, ao Senado, idem.

Continuar pedindo liberdade e intervenção militar é o mesmo que querer assobiar e chupar cana ao mesmo tempo. Exigir Democracia e AI 5, é o símbolo do contrassenso bolsonarista. Descumprimento de ordem judicial e garantia da ordem democrática e execração do STF e indicação de ministro para o mesmo tribunal segue o mesmo caminho. Confronto sempre, Coerência nunca.

Mas e daí?O chamamento ao confronto alimenta a chama dos aglutinados ensandecidos.

Como não teve o grande confronto, não invadiram o Congresso nem quebraram o STF, o final da manifestação em Brasília foi bastante choço. Não houve fuga da polícia, não houve hordas cantando slogans, nem demonstrações de arroubos machistas ou entusiasmos como os verificados na madrugada do dia 7. Nada. Saída silenciosa, sem a apoteose do gran finale. Vieram, protestaram e foram embora.

Mas não se pode dizer que foi protesto pacífico. Foram pouquíssimos os atos de violência na manifestação, mas protestos que pedem fechamento de poderes, morte e destituição de ministros, apologia ao golpismo, desrespeito à constituição e a ordens judiciais, contestações a democracia, não podem ser classificados como pacíficos. A manifestação foi pacífica, os protestos agressivos e violentos.

E para finalizar, fica no ar uma questão, nada retórica: qual a ordem de Alexandre de Moraes que Bolsonaro tem tanto medo de que seja emitida, que preventivamente já afirma que não cumprirá?