Sem promoções, policiais militares do DF falam em “operação tartaruga”

Brasília(DF), 30/06/2017 – Greve Geral – PM convoca 3 mil agentes, mas não acontece manifestação na Esplanada. Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Cresce, entre os praças, movimento de grupos policiais que prometem tirar o pé do acelerador durante o atendimento das ocorrências

Por: Carlos Carone

Engrenagens fundamentais para movimentar o sistema de segurança pública do DF, as tropas da Polícia Militar aguardavam, até o final da semana passada, um aceno positivo do Governo do Distrito Federal (GDF) para a redução do interstício – tempo entre as promoções – e a consequente progressão na carreira de pelo menos 2.693 praças, entre soldados, cabos e sargentos. As graduações gerariam impacto financeiro de R$ 124 milhões ao Palácio do Buriti, mas serviriam, na avaliação de militares ouvidos pela reportagem, de combustível para manter a tendência de queda em boa parte dos índices de criminalidade registrados nas 32 regiões administrativas do DF.

Com a negativa, começa um movimento de grupos policiais insatisfeitos, que ameaçam tirar o pé do acelerador durante o atendimento das ocorrências – algo conhecido como operação tartaruga. Em meio a esse contexto, nesta segunda-feira (19/08/2019) ocorre uma audiência pública no plenário da Câmara Legislativa que irá debater a criação de um plano de cargos e salários para a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF).

Os praças da PM questionam que colegas chegaram a permanecer por até 18 anos na mesma graduação sem alcançar a progressão na carreira. Quando a promoção ocorre de soldado para cabo, o aumento no contracheque se restringe a R$ 160 líquidos. Vários militares ouvidos pelo Metrópoles reclamaram da situação e compararam a realidade da PMDF às outras forças de segurança, como o Corpo de Bombeiros e a Polícia Civil (PCDF).

Em 13 anos, um agente da PCDF alcança o topo da carreira, enquanto um bombeiro militar recebe a primeira promoção em nove meses. “Em 10 anos, a maioria das carreiras do GDF já atingiram pelo menos 50% da progressão funcional, sendo que a Polícia Civil já atingiu quase 100%”, afirmou um dos PMs ouvidos pela reportagem.

Com o cenário caminhando para o corte nas reduções de interstício – no qual um universo de quase 3 mil policiais poderiam ser promovidos –, apenas 92 militares alcançariam a graduação na carreira. As promoções na PM ocorrem três vezes por ano, sempre nos meses de abril, agosto e dezembro, e levam em conta o tempo de serviço dos praças.

“Tivemos casos de cabos que permaneceram 15 anos sem promoção. A lei fala que pode haver a redução do interstício desse tempo, ou seja de 10 anos pode cair pra cinco, uma redução em 50% do tempo. Nos anos de 2013 e 2014, a chamada ‘operação legalidade’ precisou ser colocada em prática para a PM ser valorizada. Agora o cenário se repete”, disse outro praça ouvido pela reportagem.

Regulamentação

As promoções na PM são regulamentadas pela Lei nº 12.086, de 06 de novembro de 2009. A progressão é um ato administrativo que tem como finalidade básica a ascensão seletiva aos postos e graduações superiores, com base nos interstícios de cada grau hierárquico.

A redução prevista na mesma lei, quando relacionada a praças, será efetivada pelo comandante-geral da corporação, sendo restrita ao máximo de 50% do tempo previsto para as graduações e a existência de vagas. As entidades que defendem os interesses dos servidores, como a Associação dos Oficias da Polícia Militar (Asof), apoiam a redução de interstício, mas defendem a implementação de um plano de cargos e salários.

Segundo o presidente da Asof, tenente-coronel Jorge Eduardo Naime, é fundamental oxigenar as carreiras na PMDF, mas também fazer as mudanças necessárias de acordo com um planejamento bem definido.

“Se for possível, promover a recomposição salarial dos policiais, mesmo que não haja graduação, seria fundamental. Isso serviria para valorizar a tropa sem achatar ainda mais as carreiras. O policial, sabendo a época exata em que teria um aumento salarial mesmo sem ser promovido, sentiria-se estimulado. Isso só seria possível com a implementação de um plano de cargos e salários, que a PM não tem”, disse o oficial.

A articulação feita pelas entidades junto ao governo não surtiu efeito e, nos últimos 30 dias, o descontentamento da tropa aumentou com duas más notícias. A primeira delas envolve a incidência de tributos relacionados ao Imposto de Renda nos valores pagos pelo Serviço Voluntário Gratificado (SVG), que até então eram isentos.

“Esse era um dinheiro limpo que o policial recebia todo mês, e passou a ser incorporado de forma importante à renda familiar. O clima está horrível entre os PMs, que só falam em retornar com a operação tartaruga”, afirmou um militar lotado em uma das unidades operacionais da corporação.

A segunda notícia que deixou os militares revoltados é a criação do Hospital da Segurança Pública. Em junho, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), determinou a elaboração do projeto da unidade hospitalar para atendimento em tempo integral exclusivamente de integrantes da PM, da Polícia Civil e do Corpo de Bombeiros Militar. A orientação foi de que a unidade fosse planejada no local onde atualmente funciona a Policlínica da PMDF.

Esse, aliás, foi um dos motivos da queda da coronel Sheyla Sampaio do comando da Polícia Militar do Distrito Federal. Ela era contra a ampliação do atendimento da Policlínica da PMDF para outras corporações e foi tirada do cargo, de acordo com o secretário de Segurança Pública, Anderson Torres, por “desalinho” em relação a políticas do GDF.

Sem reajuste

Procurado pela reportagem, o secretário de Fazenda, André Clemente, afastou a possibilidade de promoção para os policiais e outros servidores no atual momento. “A recente decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) nos impede até mesmo de avançar nas possibilidades de benefícios para as categorias, uma vez que qualquer tipo de aumento de despesa está suspenso até que essa medida de efeitos nefastos que recebemos seja revertida. Não há de se falar em reajuste ou mesmo promoção com o atual cenário”, afirmou o chefe da pasta.

Clemente se referia à decisão do TCU da última quarta-feira (14/08/2019), proibindo o uso de recursos do Fundo Constitucional (FCDF) para pagamentos de aposentadorias e pensões da Saúde e Educação.

Metrópoles também procurou o Palácio do Buriti e a PMDF para falarem sobre as perspectivas de promoção para a tropa. Em nota conjunta, o Governo do Distrito Federal e a corporação afirmaram que a decisão do comando-geral sobre as promoções ainda está subordinada às condições do equilíbrio orçamentário e financeiro levado a efeito no âmbito do Poder Executivo local.

“Com relação às promoções de abril de 2019, houve a aplicação do instituto da redução de interstício que alcançou 976 policiais militares. E sobre os esforços na manutenção da oxigenação dos quadros, a Polícia Militar do Distrito Federal atua buscando que os interesses administrativos também acomodem os anseios da tropa”, diz nota.

Fonte: Metrópoles