Médico que pegou Covid-19 no trabalho é o 1º a doar anticorpos no DF
Por: Bethânia Nunes – Portal Metrópoles
Plasma sanguíneo do anestesista Lucas Valente será usado para tratar pessoas que estão lutando contra a infecção provocada pelo coronavírus
A possibilidade de ajudar pacientes que estão lutando contra a Covid-19 motivou o médico Lucas Valente, 29 anos, a doar um pouco do plasma sanguíneo – parte líquida do sangue – para uma pesquisa inovadora que está sendo realizada no Distrito Federal. O estudo vai avaliar como o sistema imunológico de um paciente infectado pelo coronavírus reage aos anticorpos doados por uma pessoa que já teve a doença e se recuperou.
“O coronavírus é uma doença muito solitária: quem está bem, se isola, e quem está doente, fica realmente afastado dos parentes, em um ambiente estranho ao que está acostumado. É muito triste”, relata Lucas, que atende justamente doentes em estado grave internados no Hospital Regional de Santa Maria (HRSM) e no Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Como é responsável por anestesiar os pacientes antes da entubação, o médico corria grande risco de ser contaminado, o que se confirmou em 05/04, quando manifestou os primeiros sintomas.
Com o diagnóstico positivo em mãos, Lucas ficou afastado da função por 21 dias. Neste intervalo de tempo, o anestesista teve perda do olfato e dor no peito ao respirar fundo. “Era uma dor bem no meio do peito. Até pensei que fosse evoluir para alguma coisa mais grave, mas foi só isso”, lembra. Além de cuidar da própria saúde, procurou proteger as pessoas do condomínio onde mora. “Fiquei em casa e saía só para fazer exames. Antes eu avisava para todo o prédio que iria descer e só passava quando o caminho estivesse liberado”, conta.
Na tarde de quinta-feira (04/06), já no grupo dos recuperados, Lucas foi a Fundação Hemocentro de Brasília fazer a doação. O procedimento durou cerca de 90 minutos.
Terapia com plasma
A técnica de transfusão de plasma para o tratamento da Covid-19 também está sendo testada no Rio de Janeiro (HemoRio), São Paulo (Hospitais Albert Einstein e Sírio-Libanês), Ribeirão Preto (USP) e Santa Catarina (Hemosc). No Distrito Federal, a inciativa é uma parceria da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB) com a Fundação Hemocentro de Brasília, o Laboratório Central da Secretaria de Saúde e os hospitais da rede pública do DF. Esse tipo de tratamento foi usado nas epidemias de ebola e H1N1 e obteve bons resultados.
“O nosso objetivo é ver se os anticorpos infundidos vão se ligar ao vírus e impedir que ele infecte novas células da pessoa que está doente“, explica o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), André Nicola, que coordena a pesquisa. Até quinta-feira (04/06), 189 pessoas recuperadas da Covid-19 tinham se voluntariado para doar o plasma.
Antes da coleta, os voluntários passam por uma avaliação para filtrar aqueles que poderão seguir na pesquisa. “Precisamos garantir que o processo de coleta de plasma seja seguro para quem vai doar e para quem vai receber”, explica André. No DF, o tratamento será realizado com pacientes do HUB e do Hran, referência no tratamento da Covid-19.
Depois de receberem os anticorpos, os pacientes serão submetidos a coletas de sangue diárias. Nesse período, os pesquisadores vão observar a evolução do quadro de saúde deles. Os cientistas reunirão dados que possam comprovar ou refutar a eficácia do método – como, por exemplo, quantos pacientes precisarão de ventilação mecânica, de internação em UTI e quantos terão o vírus eliminado do organismo. A expectativa é que os primeiros resultados sejam divulgados em quatro meses.
Como ser voluntário
Os voluntários precisam ser pessoas curadas da Covid-19, sem apresentar os sintomas há pelo menos 15 dias. Também é importante que não tenham passado por manifestações graves como choque séptico, parada cardíaca ou entubação respiratória em razão da infecção.
O prazo de duas semanas sem os sintomas garante que o doador tenha os níveis necessários de anticorpos. “A quantidade de anticorpos produzidos para combater o vírus vai subindo durante os dias. O pico se dá depois de 15 dias”, explica Alexandre Nonino, diretor executivo do Hemocentro.