TEORIA DOS JOGOS e Reflexões Policiais
Em 29/06/2020
Por: Ricardo Ziegler Paes Lemes
O objetivo do texto é trazer a abordagem da teoria dos jogos para situações cotidianas das polícias estaduais.
A premissa fundamental da Teoria dos Jogos consiste nas circunstâncias que podem ser geradas durante as relações humanas: cooperação, conflito e competição.
Se os interesses são equivalentes temos cooperação, que pode ser direta quando a concordância com fins da relação que será desenvolvida.
Por exemplo, quando há um roubo de veículo em alguma área da cidade, geralmente, todos os comandantes de viaturas empenham-se em localizar o veículo e prender o autor do roubo, independente se a ocorrência se deu fora da área de atuação dos prefixos. Regra geral, todos cooperam porque aceitam a importância da finalidade da ação de capturar os ladrões e recuperar o bem.
A cooperação pode ser indireta, na hipótese de um dos atores não concordarem ou permanecerem indiferentes em relação aos fins daquela situação, mas mesmo assim optam por cooperar e nesse caso proporcionam benefícios para todos os envolvidos na relação.
Na ocasião que a Administração necessita escalar os policiais para um serviço no horário de folga do policial e este se apresenta como voluntário para o serviço gratificado. Independente da sua concordância com a finalidade daquela atividade (manifestação, derrubada, jogo de futebol, fiscalização de atividades econômicas) , nesse caso , o policial “vende” seu tempo livre para Administração e cumprindo a escala, beneficia os próprios interesses bem como o da administração, ainda que não se interesse ou discorde da finalidade daquela missão.
Quando os indivíduos possuem interesses divergentes, inauguram-se o conflito ou a competição, aquele se encerra, em tese, adotando uma decisão definitiva que uma das partes terá que acatar, independente da sua vontade.
A antiguidade consiste no mecanismo usualmente utilizado e aceito no meio militar para solucionar determinados conflitos, em que uma parte obrigatoriamente acata o interesse do outro, portanto supondo que exista apenas uma vaga para trabalhar em uma Seção de Assessoria Jurídica da PMDF e que existam dois policiais almejando a vaga, um é 1º Sgt e o outro é 3º Sgt.
Utilizando o critério da antiguidade, o gestor pode definir facilmente quem vai ocupar a vaga, especialmente em uma organização militar, mas também pode incluir outra variável, imagine que a formação jurídica represente um dos requisitos para exercer a função nessa seção e somente o 3º Sgt seja bacharel em Direito, nesse caso se o Chefe da Seção adotar o critério da especialização para a função, o 1º Sgt será preterido.
A competição também representa uma colisão de interesses em que uma das partes é atendida e outra não, nesse caso os critérios já estão previamente definidos e aceitos entre os envolvidos na relação, o acesso a metade das vagas ao oficialato para o Quadro de Oficiais da Administração, Especialistas e Músicos (CHOAEM) depende de prévia aprovação em concurso público , com as regras definidas no edital do concurso.
A teoria dos jogos visa por meio de modelos matemáticos analisar situação de cooperação, competição e conflito, observando o comportamento das pessoas, buscando predizer as ações dos envolvidos, levando em conta a racionalidade do tomador da decisão.
Serão abordadas algumas perspectivas das Instituições policiais do DF e alguns jogos hipotéticos estudados na teoria, para produzir reflexões sobre o tema.
DILEMA DO PRISIONEIRO
JOGADOR “A”
CONFESSA NÃO CONFESSA
( – 5, -5) | (0; -10) |
(-10; 0) | ( -1, -1) |
JOGADOR “B”
CONFESSA
NÃO CONFESSA
Esse é um dos modelos mais conhecidos da Teoria dos Jogos que funciona da seguinte maneira: Dois prisioneiros tem duas possibilidades, confessar o crime ou não confessar, sendo que eles não podem se comunicar.
O que gera quatro possibilidades de resultado:
*Se ambos confessam cada um recebe uma pena de 5 anos;
*Se ambos silenciam cada um recebe uma pena de 1 ano;
*Se A confessa e B silencia; B fica preso por 10 anos e A não recebe pena;
* Se B confessa e A silencia; A fica preso por 10 anos e B não recebe pena.
Nesse caso a solução ótima é que ambos cooperem, não confessando o crime em que cada um cumprirá um ano de pena, mas como não podem se comunicar, há o risco de alguém silenciar sobre o crime e cumprir 10 anos de pena, no caso do outro prisioneiro confessar.
De acordo com GIANTURCO, 2017:
“A previsão é que os indivíduos não vão cooperar (o que é chamado de defecção), e acabarão em um equilíbrio subótimo (ambos confessam). A moral da história é que nem sempre o interesse individual levaria a um resultado coletivo ótimo e a um equilíbrio positivo.”
Talvez o conflito institucional entre PMDF e PCDF seja um exemplo aplicável a esse modelo, partindo do pressuposto que o objetivo das duas instituições seja prover segurança pública para a sociedade do Distrito Federal, restringindo essa análise a duas variáveis que compõe um panorama de segurança pública de qualidade (baixos índices criminais e aumento da sensação de segurança [baixo medo do crime]).
Contudo, atingir a excelência na segurança pública, em apertada síntese, depende de compartilhamento de informações e o desenvolvimento de atribuições que, por vezes, invadem o espectro de atuação de uma das corporações.
Possuir informações e exercer mais atribuições relacionadas à segurança pública significa maior possibilidade de influenciar nas políticas de segurança pública, acesso a cargos estratégicos e maior fatia do orçamento.
Como estamos trabalhando com uma perspectiva hipotética, definiremos que os índices criminais e o nível de poder das corporações dependeriam exclusivamente do compartilhamento de informações e atribuições e ainda trataremos as Instituições Policiais como agentes individuais em que possuem as seguintes possibilidades de ação.
*Quando ambas corporações não compartilham informações e atribuições, os índices criminais aumentam e o nível de poder se mantém estáveis;
*Quando ambas corporações compartilham informações e atribuições, os índices criminais diminuem, mas o nível de poder de ambas diminui;
*Se a PMDF compartilha informações e atribuições e a PCDF não compartilhar, os índices criminais permanecem estáveis, mas o nível de poder da PMDF diminui e da PCDF aumenta;
*Se a PCDF compartilha informações e atribuições e a PMDF não compartilha, os índices criminais permanecem estáveis, mas o nível de poder da PCDF diminui e da PMDF aumenta.
PMDF
COMPART.
NÃO COMPART.
INDÍCES CRIMINAIS E MEDO DO CRIME ( DIMINUIÇÃO ) PODER (BAIXO) | INDÍCES CRIMINAIS E MEDO DO CRIME (ESTÁVEIS ) PODER (ALTO) |
INDÍCES CRIMINAIS MEDO DO CRIME (ESTÁVEIS) PODER (ALTO) | INDÍCES CRIMINAIS E MEDO DO CRIME (AUMENTA ) PODER (ESTÁVEL) |
PCDF
COMPART.
NÃO COMPART.
Portanto, se considerarmos as Instituições Policiais como agentes que optariam pela decisão mais racional e benéfica individualmente, provavelmente escolheriam não compartilhar informações e atribuições, mesmo sabendo que com isso poderia diminuir os índices criminais e o medo do crime, pois não correriam o risco de perder poder, caracterizado pela capacidade de controlar o comportamento de pessoas, recursos financeiros e ocupação de cargos na estrutura do Estado.
A opção das Instituições no modelo apresentado seria manter o poder estável mesmo que isso viesse a aumentar os índices criminais e o medo do crime. A teoria dos jogos aduz que nem sempre decisões que beneficiam individualmente os agentes envolvidos proporcionam benefícios a toda coletividade.
Esse esboço e pequena reflexão em cima da Teoria dos Jogos nos permite entender porque é tão complicado imaginar uma reforma do nosso modelo de segurança pública.
AUTOR: Ricardo Ziegler Paes Leme
BIBLIOGRAFIA:
Gianturco, Adriano. A ciência da política uma introdução / Adriano Gianturco. – 2. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2018